Este é o terceiro texto da série “hoje é um novo dia, de um novo tempo blá blá blá”. Dezembro é temático e hoje vamos de amigo X (como chamamos na minha terra Espírito Santo), mas também pode ser amigo secreto, oculto e outra variação que não conheço. Me conta como é na sua cidade natal?
Essa edição é um presente para o Amigue Secrete “troca troca de newsletters”, proposto no grupo Newsletters BR, pelo segundo ano! O destinatário da carta será revelado ao final do texto. Uma carta pra quem não conheço e que passei a ler há pouco tempo. Um presente de grego, novamente.
Vila Velha, 21 de dezembro de 2023
Caro amigo X, essa carta casa com sua última newsletter. Até minha atual localização geográfica combina com o assunto. Inicialmente ia te escrever sobre outro assunto, mas como toda carta que se preze, se você não começa logo no dia que decide escrever, a chance de o assunto mudar é grande… O que nos mostra que muita coisa acontece, mesmo quando a gente acha que, de novo, já é natal e o ano passou voando… Mais uma vez.
O ano termina e nasce outra vez… E no meio tempo, nesse espaço longo entre o final de novembro e as festas de dezembro, a gente olha pra todo o nosso redor e fica pensativo, né? O que conquistamos no ano, o que não deu pra 2023, o que queremos fazer em 2024… E também olhamos pra ela, pra nossa casa e para os objetos que habitam nossos lares, como se eles estivessem também nos olhando de volta e perguntando: e aí? O ímpeto, por vezes, é enfiar tudo num grande saco preto e jogar pela janela imaginária, que faria cair as tralhas num buraco e assim, desapareceriam. Como se dessa forma a gente pudesse apertar um grande delete para abrir a porteira do ano novo e, com ele, uma possibilidade infinita de novidades. Mas a gente sabe que não é assim.
Os cinco custos que você elencou na newsletter estão me olhando por cima do ombro enquanto escrevo esta carta. Estou na sala de jantar dos meus pais, ouvindo o barulho do mar num dia lindo e azul de verão. Estou cercada de centenas de objetos que acompanham a história dessa família e que dividem espaço com outros recém-chegados da shoppee. Um prato da bisavó, uma souvenir do Rio de Janeiro, uma foto da minha formatura, brindes de panetone bauducco, quadros que retratam o convento da Penha, um capacete de escafandro, peras artificiais que enfeitam a mesa, um elefante de gorro de noel, um piano, um jogo de sofás de cada avó... Poderia passar a tarde inteira descrevendo esta sala, contando as histórias dos objetos que conheço e inventando para aqueles que desconheço a origem. Confesso que o exercício de olhar para esta sala ao te escrever me emocionou e me fez entender, mais uma vez, porque eu gosto tanto de ler e de escrever.
Aqui na casa dos meus pais eu sempre me pego pensando sobre as coisas, digo, os objetos. Como aqui tem muita coisa (de tudo!), é inevitável. Mesmo as visitas, que não tem relação com essa casa, como eu que morei aqui por quinze anos, também são sequestradas mentalmente pelo assunto coisas: ter ou não ter, guardar ou jogar fora, doar ou vender, quebrar, sumir… No papel de filha mais velha, por muitos anos me vi responsável pela organização anual e setorizada das coisas da casa: arrumar armários de roupa pessoal, de roupa de cama/mesa/banho, armários da cozinha e suas infinitas gavetas, os bibelôs das três cristaleiras, as coleções de souvenires, os quadros da parede… até mesmo as coisas digitais. Peguei essa missão interminável e, por vezes, ingrata, mas, confesso: preciso parar. Essa função sobrecarregou meu emocional porque as coisas não são apenas objetos. Quando estou aqui, elas conversam comigo o tempo todo, e meu ouvido é treinado para uma boa escuta. Acontece que eu estou cansada, mesmo gostando muito delas.
Eu gosto de ter coisas. Gosto mesmo. O minimalismo não me serviu, foi uma das roupas mais apertadas que já tentei vestir para agradar outrem. Ter poucas coisas me obrigou a me desfazer de itens bonitos, interessantes e outros, inclusive, sentimentalíssimos, como a coleção de cartas de amor de um namoro antigo. Me pergunto, nesse instante, o que será que minhas coisas estavam dizendo para aquelas pessoas? Eram meus objetos, minha história, meu pequeno mundo.
Aquela história da Marie Kondo, de ficar com coisas que espalham alegria e se livrar das que "não" espalham, nunca funcionou por aqui. Eu não guardo coisas porque elas me dão alegria, eu as guardo porque elas me dão uma gama de sentimentos e utilidades. Alguns objetos existem apenas para me auxiliarem no dia a dia, como uma máquina de lavar roupas ou uma cafeteira elétrica. Outros, para me lembrarem das partes bonitas do mundo lá fora, como meus potes de conchas e meus quadros. Outros ainda, como um par de tênis ou os shorts de poliéster, servem de auxílio para que meu corpo execute atividades físicas com mais conforto. Uma sala sem objetos espalhados, como você descreve no seu texto, me parece inabitável, quase como olhar para uma recepção de clínica médica ou a sala de espera de um cartório. Sem objetos, parte das minhas histórias morrem. Então, escolho com cuidado aquilo que precisa ficar e aquilo que deve seguir circulando. Acho que assim consigo fechar, com menos prejuízo, os cinco custos que você nos propôs pensar.
Que o seu final de ano seja de boas arrumações
, respeitando tudo aquilo que é importante para você e sua família. Deixo de presente a leitura de um texto sobre meu objeto preferido, o caderno.Um abraço com carinho,
Paulamaria.
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