Para tomar fôlego
As borboletas estão voando / A dança louca das borboletas / Quem vai voar não quer dançar / Só quer voar, a voar (Zé Ramalho)

No jogo do bicho, as borboletas estão na quarta posição da tabela e têm os números 13, 14, 15 e 16. No <reficofage>: reino animalia, filo arthropoda, classe insecta, ordem lepidoptera, gêneros variados. Dividem a ordem lepidoptera – de significado <asa com escamas> – com as mariposas, suas primas noturnas e temidas. Todas as borboletas passam pelas fases de ovo, larva, pupa e adulto. Imago é a chamada fase adulta dos insetos que passam por metamorfoses. Para Jung, imago é uma imagem inconsciente construída na infância e que é investida emocionalmente durante a vida: são imagens <ideais e inconscientes> dos objetos – como ser uma adulta, por exemplo. Diferentes de nós, as borboletas têm um destino a cumprir quando imagos e ao contrário do que se pensava, algumas espécies não vivem poucas semanas, chegam por vezes a quase completar um ano.
A borboleta é comumente utilizada como símbolo de transformação, por isso também é usada como referência na área de cuidados paliativos. As diferentes fases da vida selecionam diferentes necessidades que devem nos cercar. A consciência das fases é fundamental para o avanço, para o deslizar de um momento para o seguinte. A estagnação é inimiga do movimento irremediável do tempo, esse senhor de todas as coisas. Na América Latina é onde se concentra a maior diversidade de borboletas do mundo e no Brasil estão três mil e quinhentas espécies das vinte mil descritas ao redor do planeta. Somente na Mata de Santa Genebra, localizada no distrito de Barão Geraldo, em Campinas/SP, existem cerca de 700 espécies de borboleta.
Além de numerosas e encantadoras, as borboletas são indicadores de mudanças ambientais e climáticas. A mais recente espécie descoberta no Brasil chega ao catálogo já como uma espécie em extinção. A <borboleta-guerreira-das-pedras> de nome científico Agojie rupicola é encontrada em ambientes rochosos de mata atlântica e foi batizada a partir de um mix de ciência e cultura pop. Sua descoberta se deu a partir de expedições realizadas nas montanhas do leste de Minas Gerais, que produziram estudos acerca de 250 borboletas e mariposas. As expedições também geraram coleta para coleção do catálogo entomológico que recompõe o acervo do Museu Nacional, perdido em grande parte no incêndio absurdo de 2018.
No português brasileiro, o coletivo de borboletas é panapanã ou panapaná, palavra formada a partir do redobro da redução do vocábulo em tupi pa’nama. O português europeu não tem uma palavra específica para o coletivo de borboletas, emprestando outras expressões como <bando de borboletas> ou mesmo <enxame de borboletas>. Para o português africano, não encontrei expressão específica para tal coletivo, mas descobri que borboleta é o nome de um importante jogo de tabuleiro que pode ser utilizado como recurso didático para desenvolvimento de raciocínio lógico e criatividade. O que conversa com outra simbologia importante das borboletas: são ótimos exemplos de quebra de entropia na natureza. Enquanto tudo tende à desordem ou dispersão de energia dentro de um sistema (isso é entropia), a borboleta faz exatamente o caminho contrário – e logo, mais difícil. Sai de um estado no qual é quase pura gosma e se organiza até virar este ser encantador que vemos voar por aí. Sai de um estado simples para um estado complexo e essa transformação é observável.
Não foi à toa que escolhi a borboleta como tema para a primeira edição do ano. De tudo que me aconteceu em 2024, o que escolhi carregar para 2025 é a certeza da mudança. Entro nessa nova jornada de dias e meses sem muitos planos desenhados, sem metas ambiciosas ou mesmo sem contar com o que virá – que pode inclusive não vir. Quero conseguir escrever, correr, estudar, amar. Poucos verbos, poucas imposições. Explorando meus <imagos>, tenho olhado muito para o passado que me cerca. Visitar as gavetinhas, revirar registros, ficar <meio larva, meio pupa>, ainda que já esteja muito borboleta. Os estados de desenvolvimento são como ondas, a gente vai e volta, o importante é conseguir nadar no espaço-tempo, pois somos, afinal, parte de um grande cardume de borboletas. Pois é, esse é outro coletivo que encontrei no nosso português, dessa vez nas poetas brasileiras:
Primavera - Josephina Álvares de Azevedo
Oh! Na primavera as flores
São outras, tem mais frescura;
Tem mais vida, mais odores,
Tem uma seiva mais pura.O campo é mais verdejante,
As fontes mais cristalinas,
A brisa mais sussurrante,
As rosas mais purpurinas.Cardumes de borboletas
Doidejam pelos valados,
Pousando alegres, inquietas,
Nos castos lírios nevados.As gotas d’água, trementes,
São perlas amarantinas
Que brilham, belas, algentes,
Pelas relvosas campinas.Oh! Na primavera as flores
Têm outra seiva no seio…
Assim também os amores
Têm outro encanto, outro enleio.
Drops:
O poema Primavera faz parte da plaquete Cardumes de Borboletas: quatro poetas brasileiras do século XIX, organizado por Lubi Prates e
para o Círculo de Poemas. Você tem até o final do mês para assinar o Círculo com 15% de desconto através do cupom CARTAS15. Aproveite!Borboletas como indicadores ambientais
Cientistas da Unicamp e a descrição das borboletas brasileiras
Fotos de borboletas brasileiras por Marquinhos Aventureiro
O incrível arquivo da Biodiversity Heritage Library
Maria Sybilla Merian foi uma naturalista e ilustradora científica alemã que estudou plantas e insetos
Um clássico: A dança das borboletas de Zé Ramalho (com Sepultura!)
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um abraço,
paulamaria.
Lindo texto, me peguei pensando na paz de poder escrever, correr, ler e viver. Sem as peias das obrigações das listas do que se fazer no ano que se inicia.
Que lindo, Paula! Voemos 🦋