Palavras são feitas de pessoas
🍇Ela na avenida / Colorida, incontida / Ela na avenida / Solitária, solidária (Anelis Assumpção)
Cheguei ao final do semestre. Ufa. Durante três semanas revivi o caos mental que são provas e trabalhos de graduação, sensação que estava guardada no baú das emoções de uma jovem de vinte e poucos anos. Apesar dos neurônios neuróticos, excitados e exaustos, mais do que sobreviver a essa nova rotina, terminei o semestre extasiada e feliz – também tirei um belo dez na prova II de Linguística. Na terapia essa semana, confessei que me sinto mais perto daquilo que sempre busquei e não exatamente tem nome. Quando ingressei na psicologia, vinte anos atrás, foi por uma espécie de curiosidade do que são feitas as pessoas, do que afinal de contas nós somos feitos. Foi isso que me fez marcar um xis na opção pela graduação e também foi por isso que voltei para a faculdade tanto tempo depois, porque essa pergunta ainda não está respondida, eu ainda preciso de mais. Sou gulosa e pareço sempre ter fome.
Tem uma frase-isca no meu site que resume essa fome: escrever é um modo de procurar a própria palavra. Digo frase-isca porque quero mesmo capturar pessoas para que me leiam, quero que embarquem comigo nessa jornada pessoalíssima, que comprem minha inquietude e desassossego. A palavra é meu objeto preferido do mundo inteiro, logo ela, esse substantivo que, para mim, circula entre o abstrato e o concreto, que nada por águas antigas e que se funde com a própria noção de humanidade.
Ser caloura de Letras fez tremer meus conceitos sobre língua, linguagem e palavra. Entendi que para os cientistas da Linguística, palavra não é um conceito, que devemos nos referir a esses constructos como signos linguísticos, compostos de uma imagem acústica e um respectivo significante. Que a imagem acústica não é a representação do objeto no mundo e que a partir dessa descoberta quebram-se paradigmas da construção de palavras como mãe, irmão, cavalo, casa, amor, sociedade, fim do mundo em diferentes culturas. Esses signos são compostos de morfemas, os átomos, as células, as pecinhas de Lego dos linguistas, a unidade mínima de significante e significado. Por outro lado, fugindo da dureza científica da análise linguística, naveguei sobre as águas calmas e profundas dos rios da história da língua portuguesa, maravilhada com as paisagens que se apresentavam às margens: preconceito linguístico é burrice de quem não sabe absolutamente nada de onde as palavras vêm. Entre a fome de compreender e o descanso de não precisar definir, vi uma nova escritora-leitora-pessoa se formando enquanto olhava meu reflexo desse rio-mar de palavras.
Não sou o tipo de escritora que tem medo das palavras ou que sofre para escrever. Não posso dizer, contudo, que escrever é sempre confortável e que nunca escrevi chorando, mas preciso explicar que não existe apenas uma forma de procurar essa palavra. Também é necessário marcar o lugar social de onde nascem as palavras que digito com destreza e rapidez: o corpo que escreve também aparece nas palavras escritas. Sou uma mulher cis branca, com escolaridade muito acima da média do meu país e com condições de me sentir, desde cedo, minimamente confortável para procurar as minhas palavras. Pode parecer uma observação deslocada, estranha assim, aparecendo no meio do texto, porém, olhai e vês: nas palavras também tem uma fotografia.
Neste semestre, além da nova graduação, encontrei, ouvi, tietei e aprendi com muitas pessoas que escrevem. Em junho, meu mês de aniversário, tomei cafés e bati papos com a poeta Aline Miranda; estive na maravilhosa aula ilustrada de Molly Bloom com Bete Coelho e Caetano Galindo; abracei amigas escritoras na Feira do Livro do Pacaembu; escrevi a orelha do livro de poesias de Otávio de Sousa; fui ao Clube de Escrita para Mulheres; ouvi sobre os processos de Viviane Nogueira numa das aulas da faculdade… É preciso circular para promover encontros, para achar aquilo que está se buscando, para matar a fome com os banquetes que apenas o outro – a vida lá fora – pode nos oferecer.
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um abraço e até a próxima edição,
paulamaria.
Tão bonito te ver nessa aventura da palavra. Inspirador também. Adorei!
Amei um monte esse texto. Amo a palavra também e ando com muita vontade de estudar letras, mas ainda não achei um bom jeito de fazê-lo daqui da Alemanha