Voltei para a terapia esse ano, já deve ter uns seis meses. Contrariando os sabidões do Twitter, que recomendam para quase qualquer problema do mundo a terapia, não acredito que seja um caminho para todos os problemas e nem para todas as pessoas. Relutei por um tempo retormar essas aulas de mergulho em mim, mas precisava retomar pois na pandemia estava difÃcil de segurar meu forninho sozinha. Dentre aleatoriedades, segredos, nóias e problemas comuns a brasileires que moram no Brasil, um dos temas recorrentes nas sessões tem sido a dificuldade com finalizações. Veja bem, não é que eu não entenda que algo acabou. Sou boa em pegar as coisas e ir embora. Mas do lado de dentro, nas camadas infinitas de paulamariaverso, as histórias continuam em suas linhas temporais. Desde muito jovenzinha vivo assim e agora tento cavucar pra saber como, onde e porque aprendi isso. Para escrever contos, poemas e até mesmo a newsletter, inventar histórias sobre a minha vida parece frutÃfero.... Pois bem, é uma estratégia interessante que encontrei para atenuar a dificuldade com os fins. Contudo, revendo estratégias de sobrevivência, percebo que essa está ficando gasta, ou seja, tá na hora de trocar.
Minha terapia tem sido à s quartas feiras, no final do expediente. É apertado sair direto da vida dos outros e mergulhar na minha própria e, além disso, essa é a primeira vez que faço terapia online como paciente. Sinto falta da rotina da terapia presencial, principalmente da preparação desse momento tão Ãntimo. Antes da pandemia, o caminho até o consultório da terapeuta já me colocava no modo autocuidado. Caminhava cerca de duas quadras até o prédio comercial, mas antes dava uma passadinha numa doceria, comprava um brigadeiro de chocolate meio amargo e à s vezes levava um de presente para a psi. Essa lembrança aciona o paulamariaverso da época e abre linhas temporais. É nesse momento que preciso de muita cautela para poder observar o portal e resistir em me jogar ele. Pegar meu Temp Pad e voltar pro presente.Â
A finalização é difÃcil porque retorce a idealização. E contorce a gente junto. E aà dói. Essa frase surgiu nos meus pensamentos durante o banho, dia desses. Anotei rapidamente num post-it depois de me enrolar na toalha, com medo de perder algo bonito que pensei. Por vezes queria conseguir abandonar essas & outras coisas: não anotar, não escrever, não relembrar. Abrir mão das idealizações, principalmente de histórias que já chegaram ao fim. Abrir mão também da minha própria forma, daquele eu que acredito ser, daquele design que me parece familiar e útil. Deixar ir uma amizade, um casamento, um projeto profissional, um relacionamento familiar, uma casa, um curso, um sonho: eu sei que é difÃcil, porém tenho construÃdo, pedacinho por pedacinho, a ideia de que segurar, ficar e insistir é muito mais dolorido que despedir-se definitivamente.
Dizer adeus - perder uma intimidade - evoca a mesma resposta de desorientação, como uma invasão de intimidade vinda de fora. Temos de nos soltar, de nos deixar levar pelo espaço infinito, de nos deixar levar pela sociedade, de perder a conexão, de flutuar pelo cosmos social. O medo é uma perda de contato. Tememos não sermos capazes de sermos Ãntimos numa nova situação. O fim reforça a imagem de que a vida é uma conexão finita, linear, e quebrar a conexão, perder o contato, é perder a vida. Com a partida, tememos chegar ao fim da nossa existência finita - há perda de nós mesmos nessa vida, e é isso mesmo. Mas, na verdade, os fins estabelecem novas relações. (trecho do livro "viver o seu morrer", Stanley Keleman)
Além de conseguir viver histórias incrÃveis, desejo que você também descubra o seu próprio jeito de finalizá-las. Perder a intimidade pode ser a oportunidade de ser mais superficial, para num futuro conseguir aprofundar de outro jeito. Em tempos hiperconectados, ficar um pouco à deriva pode ser uma experiência fantástica, dando chance ao tédio e à s novas surpresas. Quantas novas formas entre mim mesma e o desconhecido… No paulamariaverso eu navego por estradas que já conheço., gosto delas, pois elas me trouxeram até aqui. Mas entendi que quero como o Nemo, continuar a nadar.
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Um abraço e até a próxima edição,
paulamaria